sábado, 27 de novembro de 2010

RIFÃO QUOTIDIANO
Uma nêspera
estava na cama
deitada
muito calada
a ver o que acontecia
Chegou a Velha
e disse
olha uma nêspera
e zás comeu-a
é o que acontece
às nêsperas
qie ficam deitadas
caladas
a esperar
o que acontece
Mário-Henrique Leiria

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

"Sou a sombra do que fomos e enquanto houver luz existiremos"
Luis Sepúlveda,
A sombra do que somos,
Porto Editora, Out.2009

terça-feira, 23 de novembro de 2010

O Íbis, ave do Egipto,





O Íbis, ave do Egipto,

Pousa sempre sobre um pé

(O que é Esquisito).

É uma ave sossegada

Porque assim não anda nada.

Uma cegonha parece

Porque é uma cegonha.

Sonha

E esquece -

Propriedade notável

De toda ave aviável.

Quando vejo esta Lisboa,

Digo sempre, Ah quem me dera

E essa era Boa)

Ser um íbis esquisito,

Ou pelo menos estar no Egipto.


Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993. - 24.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Isto faz-me lembrar qualquer coisa...

Palram pega e papagaio,

E cacareja a galinha,

Os ternos pombos arrulham,

Geme a rola inocentinha.

Muge a vaca, berra o touro

Grasna a rã, ruge o leão,

O gato mia, uiva o lobo

Também uiva e ladra o cão.

Relincha o nobre cavalo

Os elefantes dão urros,

A tímida ovelha bala,

Zurrar é próprio dos burros.

Regouga a sagaz raposa,

Brutinho muito matreiro;

Nos ramos cantam as aves;

Mas pia o mocho agoureiro.

Sabem as aves ligeiras

O canto seu variar:

Fazem gorjeios às vezes,

Às vezes põem-se a chilrar.

O pardal, daninho aos campos,

Não aprendeu a cantar;

Como os ratos e as doninhas,

Apenas sabe chiar.

O negro corvo crocita,

Zune o mosquito enfadonho,

A serpente no deserto

Solta assobio medonho.

Chia a lebre, grasna o pato,

Ouvem-se os porcos grunhir,

Libando o suco das flores,

Costuma a abelha zumbir.

Bramam os tigres, as onças,

Pia, pia o pintainho,

Cucurica e canta o galo,

Late e gane o cachorrinho.

A vitelinha dá berros,

O cordeirinho balidos,

O macaquinho dá guinchos,

A criancinha vagidos.

A fala foi dada ao homem,

Rei dos outros animais:

Nos versos lidos acima

Se encontram em pobre rima

As vozes dos principais.

Pedro Dinis

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Zeca Afonso eterno


Os Vampiros
(José Afonso)
No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vem em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas

São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada


No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
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